Lucinda era uma donzela do século XV, de boas famílias de origem nobre. Vivia num palácio rodeado por imensos prados verdes, de um verde luminoso que lhe iluminava o rosto. As flores rodeavam a varanda do seu quarto. Lucinda gostava muito das suas flores, que alegravam os seus dias, e eram a única coisa que conseguia secar os seus olhos molhados.
Os seus dias eram artificiais e confusos, nas festas da corte tinha de inventar sempre um sorriso, e dançar com os rapazes mais bonitos, mas nada disso a preenchia.
À noite, sozinha no seu quarto, sentia a sua vida passar. Cada segundo que o relógio indicava, entravam dentro do seu ser e deixavam-na triste, sem razões para continuar. Tinha tudo para ser feliz. Só uma coisa não a fazia desistir: dentro dela, o seu mundo, era em tudo diferente deste em que ela vivia.
Sem saber onde estava, nem para onde ia, o mais importante é que sabia o que queria. Nem as festas da corte, nem os vestidos a faziam sorrir. Sim, porque um verdadeiro sorriso, não significava só sorrir com os lábios, mas sim com os olhos.
Vivia à espera de um grande amor, de um amor que a fizesse voar, que completasse todo o seu corpo, um amor que fizesse cantar a sua alma.
As únicas viagens que gostava, eram as que fazia ao interior de si própria, era aí que se descobria, era aí que ela sorria e sonhava com o seu amor.
Procurava um sentimento mais alto, às vezes corria pelos prados e deitava-se ao sol, buscando nele e na natureza, o seu relógio.
Brincava com os pássaros, entrava nos seus cantos, parecia até falar com eles. Contava-lhes os seus desejos, confessava-lhes o seu amor, explicava-lhes que queria com todas as suas forças encontrar o seu grande amor, e este não era o que o seu pai tinha ambicionado para ela.
A vida era muito mais fascinante e misteriosa cantada e sentida a dois.
Existia um rapaz, que ela uma vez tinha visto, numa ida à cidade, nunca se tinham visto, mas houve um olhar, um simples olhar livre de tudo. Este olhar enchia os seus dias, completava-os.
Nos seus sonhos, era aquele olhar que a fazia feliz, era nele que apostava a mudança da sua vida.
Aquele olhar, era de um rapaz que vivia na cidade, de seu nome Leonel.
A sua vida era difícil. Tinha o dia todo ocupado. A sua única satisfação eram as estrelas e a lua. A noite era o único espaço de tempo que ele podia sentar-se a contemplá-los. Ao olhar para a lua, sentia aquele olhar a sorrir-lhe, aquela simplicidade que iluminava as próprias estrelas. O sol, não o admirava, fazia-o ver o mundo no qual não se integrava. Sentia que a sua essência não o chamava para este mundo. Tudo era mecânico e monótono, nada o preenchia. Só o estar vivo e respirar vida, lhe fazia transpirar de alegria. E deitar-se à noite, na relva e invocar as estrelas, em todas encontrava o sorriso de Lucinda.
Dava tudo para buscá-la e amá-la, para a sentir e para a abraçar, numa profunda comunhão, como as estrelas, e fugir, correr pelos prados.
Muito tempo passaram os dois, a viver nesta situação. Leonel não tinha outro pensamento, senão o sorriso de Lucinda e o modo como este iluminava o céu, tal como as estrelas na sua noite.
Era para ela que ele vivia.
O mesmo acontecia com Lucinda. Leonel (soubera o seu nome por uma das criadas de seu pai), era a sua própria vida, todo o seu contentamento, toda a sua única alegria de viver.
Os dois sonhavam juntos, um no outro, um de dia, outro à noite, nenhum dos dois pensava obter correspondência. Lucinda não sonhava que Leonel um dia pudesse chegar perto de si.
Enquanto isto, Leonel tentava todos os dias, apanhar uma carruagem e infiltrar-se no palácio de Lucinda, confessar-lhe o seu amor. O tempo passava e cada vez maior se tornava o seu desejo.